O Campeonato Brasileiro da Série A está entrando em sua reta final, faltando apenas cinco jogos para a sua conclusão. Em meio à pressão para a conquista do título ou para lutar contra o rebaixamento, o fator psicológico tem contribuído, em alguns casos, para o surgimento de resultados negativos dentro de campo.
Como exemplo, temos duas situações opostas na tabela. O Botafogo mantinha a liderança com uma diferença de 14 pontos para o segundo colocado e hoje, após cinco jogos sem vencer, viu a concorrência igualar a sua pontuação, podendo perder o título de uma forma vergonhosa.
Na outra ponta da tabela, o Bahia segue na luta contra o rebaixamento. Na derrota da última quinta-feira (9), o Tricolor foi goleado pelo Cuiabá, aumentando ainda mais o risco da degola.
Nestes dois casos, os treinadores mencionaram, nas coletivas de imprensa pós derrotas, que há sinais de despreparo emocional em alguns atletas.
Diante desta situação, o site dos Galáticos on line procurou o psicólogo clínico e especialista em avaliação psicológica, Sergio Manzione, com mais de 35 anos de atividades profissionais, para explicar sobre o fator psicológico no esporte.
“Primeiramente, quero dizer que o Campeonato Brasileiro é muito longo. Então ele tem muitas variações, muitas coisas podem acontecer. Isso gera um estresse físico logo de cara. Você vê que as equipes vão chegando no final do ano e as que não estão bem preparadas, não tem um descanso, vão ficando para trás, porque esse é um calendário muito apertado. Além disso tem uma pressão grande do clube em cima do time, tem uma pressão da torcida. Existe uma pressão também dos patrocinadores. E tudo isso vai desembocar uma auto cobrança desses atletas”, comentou.
Confira a entrevista:
De que forma o estresse pode afetar o desempenho esportivo e quais são as estratégias para lidar com isso?
“Olha o estresse, ele pode ter vários impactos negativos. O desempenho afeta tanto o aspecto físico, quanto o mental. Então existe, por exemplo, uma resposta fisiológica, o estresse, ele vai desencadear aquela resposta fisiológica de luta ou fuga. Então ele dispara hormônios como adrenalina e cortisol. Então, esses hormônios são benéficos na situação de emergência, porque vai acontecer com várias alterações no corpo, diante de uma ameaça. Quando isso é prolongado e a exposição exagerada, adrenalina, cortisol, estresse constante, aí pode levar cansaço, fadiga, diminuição da coordenação, até motora, e a resistência a doenças também cai. Então a resposta fisiológica é uma primeira coisa que pode acontecer também. A concentração e a tomada de decisões rápidas e precisas, o atleta pode ficar distraído, tem dificuldade em focar no jogo, cometer erro que normalmente não cometeria. As lesões também podem aumentar porque o estresse pode aumentar essa suscetibilidade de lesões, uma vez que a tensão muscular está muito grande, o corpo fica mais tenso, diminui a flexibilidade e a capacidade de recuperação, então pode sofrer lesões maiores. Em outros casos também tem problemas de comunicação e cooperação. O estresse pode impactar relações sociais e a comunicação da equipe. Então é importante é que os atletas aprendam estratégias eficazes para gerenciar o estresse. O gerenciamento do estresse é crucial porque ele vai ter um impacto significativo no desempenho desportivo e na saúde geral. Então, algumas coisas que ele pode fazer para gerenciar esse stress, respiração controlada. Praticar técnica de respiração profunda, para poder baixar a ansiedade e acalmar sistema nervoso. Tem exercícios de respiração para isso que pode ser realizado antes e até no meio da partida em que o jogador pode reduzir essa ansiedade”.
Como a psicologia esportiva pode influenciar o desempenho de um atleta durante uma competição?
“A psicologia desempenha aí um papel crucial durante a competição, porque vai mexer em vários aspectos mentais. Por exemplo, a psicologia pode trabalhar no desenvolvimento da autoconfiança do atleta. Atletas com autoconfiança tem mais probabilidade de enfrentar desafios com determinação, resistir mais a pressão e manter o foco mesmo diante de dificuldades. Outra coisa importante é o controle de estresse psicológico. Isso é importante, como a respiração, visualização e tal. Outra coisa que a psicologia esportiva pode fazer é o aumentar o foco e a concentração. Habilidades, foco, são habilidades que a pessoa treina, a pessoa adquire. Então, a psicologia esportiva trabalha o desenvolvimento de metas que é essa capacidade de voltar ao estado normal. Exemplo de Botafogo e Palmeiras. Palmeiras tomando 3 a 0, aí palavras importantes que foram feitas e o time volta e virou o jogo. Então isso é importante! Funciona sempre? Não, não funciona sempre, porque tem sempre o adversário, né? O Palmeiras é uma das referências na psicologia esportiva e que já trabalha com isso há muitos anos. A psicologia esportiva vai melhorar o autoconhecimento e vai tirar aqueles problemas que podem estar atrapalhando o controle da ansiedade e desenvolver inteligência emocional”.
Como a motivação e a mentalidade impactam o sucesso de um atleta em sua carreira esportiva?
“Se você tiver baixa motivação e não tiver uma mentalidade positiva, você provavelmente não vai alcançar sucesso em carreira nenhuma. Não é só na carreira esportiva, mas eu diria que a determinação e a persistência são importantes, onde o atleta tende a ser mais determinado e persistente, alcançando melhor o seu objetivo. Por isso que a gente falou em resiliência, que é essa capacidade de absorver essa motivação sustentável ao longo do tempo. Por todo aquele trabalho que é feito pela psicologia esportiva, os atletas podem superar obstáculos e manter o foco, mesmo dando dificuldades. Você vê que um atleta, por exemplo, de uma olimpíada, quantas vezes o cara vai saltar com salto de vara? Quantas vezes ele erra? Mas ele não desiste. A resiliência que eu falei é importante, não é? Então ele precisa se adaptar aos problemas e voltar para o foco racional. Autoconfiança é importante, sim. Além da autoconfiança, ele tem que ter aprendizado contínuo, não pode parar e está sempre aprendendo, em busca constante para melhorar as suas habilidades. Então ele aprende com os treinadores, aprende com os colegas, aprende vendo campeões, aprende vendo grandes atletas e aí ele vai incorporando e vai transformando isso num aprendizado contínuo. Essa adaptação a mudanças é muito importante e tem que ter uma mentalidade mais flexível. Ele tem que aceitar mudanças. Ele tem que é ser dinâmico, porque é essencial no ambiente desportivo. A pessoa tem que ter a mente aberta, senão ele não consegue se adaptar à mudança de treinadores. Então, atletas que são motivados são mais propensas a se adaptar a novas estratégias. O autocontrole que pode gerenciar suas emoções e fazer com que isso não atrapalhe as decisões racionais, a satisfação pessoal e o bem-estar. Então, além do sucesso competitivo, quer dizer ganhar um campeonato, ganhar uma partida. É importante que essa motivação intrínseca na pessoa esteja ligada realmente à satisfação pessoal. Atletas que encontram significado encontram alegria na prática esportiva são mais propensos a manter uma carreira esportiva duradoura e gratificante para eles e serve para qualquer profissão”.
Qual é o papel da autoconfiança na performance esportiva e como os atletas podem desenvolvê-la?
“O papel da autoconfiança pode levar a um desempenho mais excepcional. Ele arrisca e pode colher coisas mais importantes. Então ele tendo autoconfiança, ele persiste, errou, ele recupera o emocional, persiste, errou, recupera, então ele vai se aprimorando, ele vai habilidades são mais eh ele tem mais habilidades pra superar falhas. Errar não é um motivo de desespero. Errar ou perder são questionamentos. Onde é que perdeu? Vamos trabalhando, né? Concentração e foco são importantes para a autoconfiança te dar uma condição de lidar com aquelas pressões, que falei lá no começo. Então, estabelecer meta realista, como ele pode fazer e o que ele pode fazer pra melhorar. Foco nas próprias habilidades que ele pode e tem que melhorar sempre nas conquistas passadas. Relembrar e celebrar conquistas passadas ajuda a reforçar a autoconfiança”.
Quais são os sinais de esgotamento mental em atletas e como a psicologia pode ajudar na prevenção e tratamento desse problema?
“Esse esgotamento mental, quando ele é oriundo do trabalho, é conhecido como síndrome de Burnout. É um problema sério que pode afetar os atletas. A caracterização desse estresse é exaustão física e mental profunda, sentimento de desânimo, redução do desempenho esportivo e até uma atitude negativa em relação ao esporte. Vamos lembrar aí, Simone Biles, que se afastou do esporte. Provavelmente ela estava com uma síndrome de Burnout e precisava ter momentos para resgatar o seu equilíbrio emocional. Mas em termos de sinais de esgotamento mental dos atletas, a gente pode dizer que é quando tem aquele aquela fadiga persistente, esse cansaço constante, incapacidade de se recuperar, mesmo após períodos de descanso e diminuição de desempenho, às vezes acompanhada por falta de interesse nas competições. Problema de concentração é outro sinal importante. E como é que a gente pode fazer para ajudar na prevenção e o tratamento? Tem que ver a variação de diagnóstico. Isso pode ser feito de uma forma eficaz com treinamento de gerenciamento de estresse, que é exatamente o desenvolvimento da inteligência emocional como lidar sempre com a reformulação de metas, expectativas, se tem uma pressão grande para o jogador também, que ele joga num time menor, mas ele quer ter um destaque para ver se é contratado por um time maior. O sonho ir pra Europa também, ele precisa ter essas metas bem claras e também precisa desenvolver essas habilidades de enfrentamento. Então é buscar um equilíbrio saudável entre a vida esportiva e a pessoal. Não é uma vida pessoal, esculhambada, certas pessoa tem que ter uma vida pessoal organizada, ter uma vida pessoal correta, com disciplina, com uma série de questões. Muitos atletas pensam que estão jogando no futebol profissional, por exemplo, como se eles estivessem jogando aquele jogo de final de semana com os amigos, né? Bebida, farra etc... atleta profissional não funciona assim porque tem muita coisa envolvida. E tem muito dinheiro envolvido nisso, né? Então o aconselhamento e apoio emocional são importantes. Então, ensinar os atletas sobre a importância da recuperação física e mental vai prevenir o esgotamento”.
Como a gestão emocional pode impactar a resiliência dos atletas diante de derrotas e adversidades?
“Primeiro tem que ter um trabalho para aceitação de emoções negativas. A gestão emocional envolve essa capacidade de reconhecer e aceitar emoções negativas, com tristeza, frustração, raiva, sem deixar que elas dominem completamente a inteligência emocional. Isso vai permitir que o que o atleta enfrente e aí vai processar essas informações de maneira construtiva. O time está tomando de 3 a 0, pressão da torcida, etc. A pessoa tem que saber o que fazer. Ali tem que desligar, tem que ter técnica para isso, tem que aceitar as emoções negativas para poder trabalhar com elas e aumente também adaptação às mudanças. Aquela história da resiliência, o Abel Ferreira disse, ‘olha, nós já perdemos o primeiro tempo, então vamos jogar aí, o segundo, só isso’. Aí já mudou o quadro mental de todo o mundo, entendeu? Então eles voltaram para ganhar o segundo tempo. Isso vai fazer com que a gestão emocional possa manter a autoconfiança que eles conhecem. Primeiro tempo apanha e a lição aprendida deixa para lá. Vamos fazer diferente aqui, totalmente diferente para a gente reverter esse resultado. Tomada de decisões racionais, isso que é importante, então a gestão emocional contribui para essa capacidade do atleta de tomar decisões racionais e ponderadas. Ele tem que se afastar das decisões emocionais, porque isso vai gerar algum tipo de problema. Mesmo sobre provocação, por isso que ele tem que ter um treinamento e que tem que ter um acompanhamento psicológico que prepare isso. Eu tenho que ter relacionamentos positivos com todo mundo, colega de equipe, funcionários... Resiliência emocional está diretamente ligada à saúde mental. Atletas que praticam a gestão emocional regularmente, ou seja, que estão preparados para desenvolver a inteligência emocional enfrentam desafios mentais associadas ao esporte de maneira mais saudável”.